Nos corredores do mercado de mineração e tecnologia, poucas perguntas geram tanto burburinho quanto esta: “É verdade que Elon Musk comprou um terreno em Minas Gerais?”. A pergunta, que surge com frequência em conversas e pesquisas online, alimenta sonhos de uma Gigafactory da Tesla em solo brasileiro e acende a imaginação sobre o futuro da nossa indústria.
Como jornalista que acompanha há anos a corrida global por minerais estratégicos, posso afirmar: é preciso separar o fato da ficção. Até o momento (junho de 2025), não há nenhuma confirmação pública ou registro oficial de que Elon Musk, a Tesla ou a SpaceX tenham adquirido um terreno específico para uma grande fábrica ou projeto de mineração em Minas Gerais.
Contudo, a ausência de uma escritura não torna a pergunta menos relevante. Pelo contrário. A verdadeira notícia não está em uma compra de terra, mas na resposta a uma questão muito mais profunda e estratégica: Por que Minas Gerais se tornou um alvo tão cobiçado no radar do empresário mais disruptivo do nosso tempo?
A resposta é complexa e envolve uma combinação de geologia privilegiada, geopolítica e a busca incansável pelas matérias-primas que alimentarão o século XXI. Minas Gerais não é apenas um estado; é um tabuleiro estratégico no grande jogo da tecnologia e da transição energética. E Elon Musk sabe disso melhor do que ninguém.
1. O “Vale do Lítio”: A Nascente do Novo Petróleo

O principal fator de atração tem nome e sobrenome: lítio. Para a Tesla, cujo império é construído sobre baterias de íon-lítio, garantir o acesso a este metal alcalino não é apenas uma vantagem competitiva; é uma questão de sobrevivência. E Minas Gerais abriga o Vale do Jequitinhonha, uma região que está rapidamente se tornando um dos polos de produção de lítio mais promissores e observados do mundo.
Diferente de outras grandes fontes globais, como os salares do Chile e da Argentina ou as rochas da Austrália, o lítio do Jequitinhonha, extraído de rochas de espodumênio, possui duas características que o tornam o objeto de desejo de Musk:
- Alta Pureza: O mineral encontrado na região permite a produção de um hidróxido de lítio de altíssima qualidade, componente essencial para as baterias de longo alcance e alto desempenho que a Tesla utiliza em seus veículos.
- “Lítio Verde”: As empresas que operam na região têm adotado processos de produção com baixo impacto ambiental, utilizando energia 100% renovável, sem barragens de rejeitos e com recirculação de água. Para uma marca como a Tesla, que vende uma imagem de sustentabilidade, associar-se a um “lítio verde” é uma poderosa ferramenta de marketing e ESG (Governança Ambiental, Social e Corporativa).
Garantir uma fatia da produção mineira significaria para a Tesla diversificar sua cadeia de suprimentos, hoje fortemente dependente da China para o refino, e reduzir drasticamente os riscos geopolíticos.
2. Muito Além do Lítio: Um Banquete de Minerais Estratégicos
O interesse por Minas Gerais seria míope se parasse no lítio. O estado é uma potência polimetálica, oferecendo um verdadeiro banquete de outros elementos cruciais para os negócios de Musk:
- Nióbio: O Brasil detém mais de 90% das reservas mundiais de nióbio, e a maior parte está em Minas. Este metal, quando adicionado ao aço, cria ligas ultrarresistentes e leves. Onde isso é útil? Nos foguetes da SpaceX, que precisam suportar condições extremas, e na estrutura dos próprios carros da Tesla, buscando sempre a redução de peso para aumentar a eficiência.
- Grafite: Essencial para a fabricação dos ânodos (o polo negativo) das baterias de íon-lítio. Minas Gerais possui depósitos significativos de grafite de alta qualidade. Controlar o acesso a este mineral é tão estratégico quanto controlar o lítio.
- Terras Raras: Embora as reservas mais expressivas estejam em outros estados, Minas também possui ocorrências. Elementos como o neodímio e o praseodímio são usados para fabricar os ímãs permanentes superpotentes que movem os motores da maioria dos veículos elétricos. Garantir fontes fora da China é uma prioridade para toda a indústria automotiva ocidental.
Minas Gerais oferece a possibilidade de um “one-stop shop”: um único lugar no mapa com acesso a múltiplos insumos críticos para toda a gama de produtos do universo Musk.
3. Starlink: Conectando o Campo e Criando um Novo Mercado
A estratégia de Musk para o Brasil transcende a mineração e a indústria automotiva. Sua outra gigante, a SpaceX, tem um interesse direto no vasto território brasileiro através da Starlink, seu serviço de internet via satélite.
Minas Gerais, com seu território extenso, relevo acidentado e um dos setores de agronegócio mais fortes do país, representa um mercado ideal. Fazendas, cooperativas e comunidades rurais, muitas vezes mal atendidas pela internet tradicional, são clientes perfeitos para a Starlink. Ao viabilizar a “agricultura 4.0” com conectividade de alta velocidade, Musk não só expande seus negócios de telecomunicações, como também fortalece laços econômicos e logísticos com uma das regiões mais ricas do Brasil.
Uma Compra Estratégica, Não Apenas de Terra
Então, voltamos à pergunta inicial. Elon Musk comprou um terreno em Minas Gerais? Fisicamente, a resposta provável é não. Mas, estrategicamente, ele está “comprando” a ideia, o potencial e a relevância de Minas Gerais no cenário global.
As visitas e reuniões com autoridades brasileiras no passado não foram meras cortesias. Foram movimentos calculados para sinalizar interesse, avaliar o ambiente de negócios e colocar o Brasil e especialmente Minas Gerais no centro de sua estratégia de longo prazo para garantir os recursos que manterão suas fábricas funcionando e seus foguetes voando.
A verdadeira “compra” não é de um lote de terra, mas sim um “buy-in” estratégico no futuro de uma das regiões mais ricas em minerais do planeta. Se isso vai se materializar em uma fábrica, uma mina ou um centro de distribuição, só o tempo dirá. Mas uma coisa é certa: o flerte entre Elon Musk e os tesouros de Minas Gerais é um dos enredos mais importantes para se acompanhar na nova economia global. E ele está longe de terminar.